Para mim, não pode faltar café, jamais, ele precisa estar sempre presente!!!
E, bem-dito, passado na hora!!
Afinal, foi pela Zona da Mata que o café entrou em Minas Gerais, por volta de 1707. Nunca mais saiu da mesa!
A propósito, lembro que a minha velha casa, na chácara em Rio Branco, ficava literalmente nos pés dos trilhos da antiga Estrada de Ferro Leopoldina que nasceu em meados do século XIX, vejam só, justamente para substituir o velho transporte desses grãos, que, até então, era feito por tropas de mulas.
Tendo sido assim, tomar o café da tarde, principalmente no interior das Gerais, era hábito das antigas e sempre foi, para todos nós, mineiros de raiz profunda, o mais solene e sublime momento da casa.
Sem dúvida, o mais importante!!!
Eu adorava quando começava a escutar lá da nossa copa, o típico tilintar das xícaras que, em sendo barulho “pró café” sinalizava, com certeza, a presença de amigos, considerados mais família do que meros vizinhos, com crianças, lógico, para se juntarem a mim, enquanto os adultos trocavam casos ao redor da nossa mesa.
Os convidados já sabiam, a senha inventada para não se atrasarem, era ficar atento ao apito da chaminé da bela São João, a Société Sucrière de Rio Branco, que retumbava diariamente no meio da tarde pela cidade inteira, lembrando ser hora do café.
Nesse momento, mesmo encantada e feliz, não me distraia um segundo porque queria saber de tudo, e ficava de orelha em pé, naquela de tentar escutar um tiquinho, que fosse, da conversa grande.
Também, era tão bom, momento tão feliz, tantas casos e risos que, até hoje, meu melhor programa é tomar café com amigos e, muito mais, se forem conterrâneos para podermos viajar, juntos, harmoniosamente, nas mesmas lembranças da infância.
Entre um gole e outro, eu comecei a contar um dos passeios mais interessantes e pitorescos que havia feito com minha avó Neném, por volta dos meus 6 anos de idade.
O convite era para almoço na casa & fazenda onde morava o Sr. Henrique Almeida, Administrador da Usina e tio dela.
Era a única criança e três fatos haviam marcado aquele domingo para sempre: primeiro, porque viajei aboletada num trolley da Usina São João, carregado de cana caiana e eu lá em cima, no topo.
Foi o máximo! Viagem inesquecível!!
Embarcamos de dentro da Usina e, devagarzinho, o pequeno trolley foi serpenteando as fazendas e canaviais.
Segundo: porque na hora de servir o almoço, a esposa dele, D Marieta, gentilmente me deu a mão e me levou para o jardim e me disse: você vai almoçar ali!!
O “ali,” incrível, não era qualquer ali!
Era uma bela casinha de bonecas, que eu nunca imaginei existir, e o que dirá, conhecer e poder estar dentro, naquela minha idade??
A alegria foi tamanha que perdi a fome e só queria ficar quietinha, curtindo na base do “lar doce lar” como se fosse minha, eternamente!!
Mas, durou pouco. Comentei que, após o almoço havia ficado indignada porque me tiraram da casinha para fazer um programa, sabem qual? Acreditem: “visitar uma árvore”.
E, óbvio, não gostei da ideia! Imagina?!
Árvore era o que eu mais tinha na minha geografia mineira, adorava, conhecia todas, principalmente as frutíferas. Vivia numa chácara, balançando de galho em galho e meu espanto, naquele momento, foi até maior porque esta, em particular, mereceu todo um singular cerimonial.
Lembro que, de mãos dadas, escutamos um pequeno discurso do Sr Henrique e, depois, fizemos imensa roda em volta dela e, assim, ficamos um tempão, abraçando a árvore.
Finalizando, contei para D Therezinha que este gesto, mesmo adulta, continuava
inexplicável, eu nunca tinha encontrado uma razão específica e foi quando ela se levantou e disse: “Elza e Carlos, venham, quero lhes mostrar uma coisa.”
Saímos de carro e pouco tempo depois estávamos em Guidoval, na Comunidade do Pombal, de frente da bela Samanea Inopinat, a popularmente conhecida Sete Cascas!
Quando imaginaria? Nunca!
Só mesmo, graças à D. Therezinha, com sua sensibilidade cultural, que eu pude entender a beleza daquele abraço e, mais ainda, da árvore.
Tão majestosa, que no ano de 1800 já fora estudada pelo explorador Alexander Von Humboldt pela elegância e singularidade de seu tronco que chega a ter por volta de 1 metro de diâmetro, composto por pregas salientes.
Naquela época, a Samanea era jovem e Guidoval já tinha se preocupado em sacramentar sua importância com uma placa identificando a espécie.
E, no último dia 28 setembro, a cidade comemorou seu centenário com a tradicional Festa da Árvore, atraente marco turístico que reúne toda a comunidade da região.
E, Rio Branco, que pena! Triste! Não me conformo! Descuidou das suas galinhas de ovos de ouro. Não soube entender, e valorizar, o muito maior e extraordinário potencial turístico das suas Usinas!!
As Sucrières!!
Turismo é das mais importantes fontes de recursos para a economia tanto que, em Paris, existe até o tão atípico, quanto famoso, “Musée Des Égouts”, que exibe, subterraneamente, o secular sistema de água e esgoto da Cidade Luz.
Hoje, a nossa São João podia ser um pequeno que fosse, mas histórico, “Hotel & Museu do Açúcar”.
Mesmo desativada, não só todo seu passado de importância sócio-econômico para a nossa cidade, mas principalmente sua estrutura arquitetônica, sempre foi, por si só, belo monumento!!
Bastava Rio Branco ter feito dela um singular produto turístico!!
Mas, para mim, a infância não acaba nunca, principalmente agora, pós pandemia, que o futuro ficou perdido, o agora?...aflitivo mundialmente e sobrou, o meu passado, para me confortar.
Eu estarei, sempre, caminhando pelos caldeirões da Sucriére São João; pegando torrões de mascavo; viajando de trolley; sentadinha na casinha de bonecas e abraçando, demoradamente, a Samanea Inopinata!!
Publicado no jornal ''A nova Imprensa" de Visconde do Rio Branco/Minas Gerais-MG, Edição n. 142. 4.11.2022.